Gourmet

Meu gosto por culinária e por vinhos é quase genético. Nasci nos anos 50 em uma família italiana cercado de tias, primas e irmãs, todas excelentes cozinheiras. Aprender a cozinhar na minha família era uma obrigação cultural a ser passada de mãe para filha, de geração em geração. Eu era o caçula da família depois de 3 irmãs e como ficava com minha mãe enquanto as irmãs estavam na escola, fui promovido a provador oficial de tudo o que se fazia na cozinha, onde eu ficava bisbilhotando a minha mãe preparar pratos que eram sempre  um banquete de gostosuras.

Fim de semana então era uma festa. Os almoços de domingo começavam a ser preparados desde sexta, com meu pai e eu indo na feira livre comprar legumes, verduras e frutas que eram deixadas na barraca do Toninho, que acomodava tudo em uma ou mais caixas entregava tudo na minha casa. De lá passávamos no açougue em frente da estação de trem, onde o açougueiro, também amigo da família,  já tinha separado as carnes que íamos levar, e no caminho de volta pra casa, parávamos na mercearia do seu José com a lista de ingredientes para completar o almoço.

A mercearia era meu lugar favorito, com seus corredores formados pelas prateleiras que tinham um pouco de tudo, baldes, panelas, vassouras, farinhas, bebidas e latarias. O seu José ficava atrás de um balcão de madeira com vidro na frente e tampo de mármore, onde ficavam a balança, a maquina de cortar frios e a grande caixa registradora de ferro, daquelas que tocava um sininho quando abria a gaveta de dinheiro. Enquanto ele separava a lista de compras eu ficava circulando entre as prateleiras e escolhendo um doce em lata, que o seu José sempre dava de brinde nas compras maiores. As opções se limitavam a pêssego ou figo em calda, goiabada, marmelada, pessegada e marrom glacê e ainda o quatro em um da Cica que tinha os quatro sabores numa lata. As compras eram anotadas na caderneta e pagas no final do mês.

Eu morava em Santo André, numa casa bem grande e no quintal, além das arvores frutíferas, tínhamos um galinheiro e uma horta, muito bem cuidados pelo nosso caseiro Joaquim, que forneciam as verduras e temperos fresquinhos, ovos e as aves. A cozinha era enorme e ficava ainda maior para mim que era pequeno. Piso de cerâmica vermelha, paredes com azulejos brancos até uma certa altura, terminando numa faixa de azulejos azul claro, o grande fogão de seis bocas e uma geladeira Philco daquelas redondas dos anos 50. Um grande balcão de mármore, com armários em baixo e uma pia em um dos cantos, ia de um canto a outro da parede.

No sábado de manhã começavam os preparativos para o almoço de domingo. O Joaquim matava os frangos e colhia as verduras para a salada, meu pai e eu fazíamos as massas e minha mãe, ajudada por minhas irmãs, o molho, as carnes e os doces  de sobremesa.

O molho era especial, primeiro minha mãe cozinhava a carne por horas em um caldeirão para fazer o caldo, enquanto tirava a pele e os caroços de quilos de tomates que eram passados no liquidificador (coisa de luxo na época), com as cebolas e os temperos. Tudo era juntado em uma panela de ferro com banha de porco e pedaços de toucinho  e cozido por horas em fogo bem baixo, apurando até ficar um molho vermelho escuro, espesso e com um sabor inigualável.

A carne cozida para o caldo era então desfiada, temperada com cebolas, azeitonas, salsinha e especiarias e servida separadamente (carne a lesso como se chama na Itália).

Os frangos eram temperados com ‘vinha d’alho”, uma mistura de vinho, suco de limão, alho picado, cebolas picadas, folhas de louro, salsa, manjerona, sal e pimenta e azeite. No dia seguinte eram recheados com farofa feita com os miúdos e farinha de milho, e assados no forno em fogo lento.

Do outo lado, meu pai abria a massa no balcão de mármore coberto por farinha e eu ajudava a passar a massa no cilindro, até ela ficar bem fininha, pra então cortar o talharine, dobrar os maços de fios e espalhar no mármore onde secavam até o dia seguinte, na hora de ir pra panela.

O almoço era servido na copa, uma sala ao lado da cozinha com uma mesa de madeira larga, quase quadrada, que acomodava perfeitamente meu pai e minha mãe nas pontas e minhas irmãs e eu nos lados, cada um com seu lugar, e um armário que tinha estratégicamente os pratos e travessas na parte de baixo, gavetas no meio com talheres, toalhas e guardanapos e em cima portas de vidro com os copos e taças.

Uma viagem pelos sabores da cozinha e prazeres do bom vinho. Aqui vou dividir minhas experiencias em gastronomia, comentar restaurantes, botecos, casa de amigos e principalmente publicar as receitas que foram aprovadas pela nossa turma de amigos gourmands.

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